Nem a propósito, lembrei-me da
piada de Ricky Gervais acerca do
popular ditado “é melhor chegar atrasado do que morto”. Cerca de um mês e meio
depois chega finalmente a clássica review acerca da entrega dos tão cobiçados
galardões. As minhas desculpas pela demora, mas acho que esta review só faz
sentido depois de consumadas as reviews da grande maioria dos filmes nomeados,
daí esta sequência de críticas cinematográficas assim de “estalo” (pun intended) nos últimos dias. Escusado será dizer que
mais uma vez não assisti à cerimónia, aliás depois de pensar um pouco mais
aprofundadamente no assunto cheguei à lógica conclusão que o acentuado
decréscimo de audiência da cerimónia dos Óscares
está directamente relacionada com uma generalizada e justificada falta de
interesse no cinema por parte do público mais exigente.
Para
variar um pouco desta vez vou começar por dois prémios que estão umbilicalmente
ligados (Melhor Guarda Roupa e Melhor Maquilhagem e Penteado), e aqui
a concorrência foi apertadíssima. No Óscar
de Melhor Maquilhagem e Penteado os favoritos ‘Coming 2 America’, ‘Cruella’
e ‘House of Gucci’ acabaram por
deixar fugir o prémio para a supressa ‘The Eyes of Tammy Faye’, destaco a inexplicável ausência de ‘Being The Ricardos’ nesta categoria. No Melhor Guarda Roupa foi ‘Cruella’ a arrecadar o prémio (o seu
único) de forma algo injusta diria eu, pois penso que ‘West Side Story’ teve um padrão de exigência muito mais difícil de atingir.
De
alguma forma também interligados, o Óscar
de Melhor Design de Produção acabou por cair para ‘Dune: Part One’ vencendo a forte concorrência de ‘Nightmare Alley’, um filme que acabou por não confirmar nenhuma das
suas quatro nomeações.
E
falando em ‘Dune: Part One’, o filme
pulverizou completamente a competição em todas as categorias técnicas (Melhor Som, Melhor Edição e Melhores
Efeitos Visuais), categorias onde simplesmente não havia qualquer tipo de
oposição digna desse nome. Apesar de ser um dos prémios que menos me estimula
(devo confessar), um destaque para o triunfo do fabuloso Hans Zimmer na Melhor Banda
Sonora (também em ‘Dune: Part One’) Zimmer que tinha rejeitado a oferta do
seu amigo Christopher Nolan para
participar em ‘Tenet’ precisamente
por estar concentrado em ‘Dune: Part One’.
No
Óscar de Melhor Filme Estrangeiro o
meu cometário tem de ser reduzido pois apenas vi ‘Drive My Car’, posso no entanto dizer que pela amostra do vencedor os
restantes nomeados serão por certo filme calamitosos.
No
cada vez mais apetecível galardão de Melhor
Cinematografia quem levou novamente a melhor foi ‘Dune: Part One’ arrecadando o seu sexto Óscar
em nove possíveis ultrapassando no “Photo finish” as formidáveis performances
cinematográficas de ‘West Side Story’
e ‘The Power of the Dog’.
Nos
Óscares de Melhor Argumento Original e
Adaptado, prémios onde já vão sendo
tradição as decisões mais absurdas, desta vez também não foi excepção. Se ainda
consigo aceitar a conquista de ‘CODA’
na condecoração de Melhor Argumento Adaptado embora ‘Dune: Part One’ também o
merecesse não consigo de maneira alguma aceitar a vitória de ‘Belfast’ no Melhor Argumento Original, ‘Belfast’
é um filme que têm alguns pontos positivos mas o argumento certamente não é um
deles até porque basicamente não existe, é verdade que este ano não foi
prolifico em termos de bons argumentos originais (talvez a minha escolha
pessoal recaísse sobre ‘Don't Look Up’)
mas a escolha de ‘Belfast’ é no
mínimo provocatória.
Chegamos
ao momento mais problemático e dramático (em todos os sentidos) dos Óscares, as distinções no domínio da interpretação.
Nas actrizes o Óscar de Melhor Actriz
Secundária foi entregue a Ariana
DeBose pela brilhante interpretação da personagem Anita em ‘West Side Story’
de forma merecida embora seja justa uma menção honrosa a Judi Dench pelo seu papel em ‘Belfast’.
Enquanto na Melhor Actriz Principal tenha
de discordar com a Academia pois
apesar da excelente e difícil representação Jessica Chastain na pele de Tammy
Faye em ‘The Eyes of Tammy Faye’
ela não supera de todo a de Nicole
Kidman/Lucille Ball em ‘Being The Ricardos’, aliás Kidman arranca aqui uma representação
que se afigura como uma das melhores da sua carreira e num tipo de personagem
com um contexto muito similar ao de Chastain,
por isso perfeitamente comparável. Na esfera masculina temos a vitória indiscutível
de Troy Kotsur pelo seu admirável
papel em ‘CODA’ na categoria de Secundário, e a empolgante e emotivo
triunfo de Will Smith como ‘King Richard’, vestindo a pele do pai
das mais famosas irmãs do ténis mundial (Venus
e Serena Williams). Não pondo em
causa a versatilidade e entrega de Smith
e dando de barato que a sua prestação supera o competente desempenho de Denzel Washington como Macbeth ('The Tragedy of Macbeth') ou a fantástica performance de Andrew Garfield como Jonathan Larson em ‘tick, tick... BOOM!’ ela não suplanta a excepcional demostração de
talento de Benedict Cumberbatch como
Phil Burbank em ‘The Power Of The Dog’.
Na
categoria de realização, novamente o reparo para a exclusão de Aaron Sorkin (‘Being The Ricardos’) nas nomeações e o merecido destaque para a
única conquista de ‘The Power Of The Dog’
(Jane Campion), num prémio que a meu
ver podia e devia ter sido discutido entre Kenneth
Branagh (‘Belfast’), Steven Spielberg (‘West Side Story’) e Denis
Villeneuve (‘Dune: Part One’) ele que inacreditavelmente
também não estava nomeado.
O
galardão de melhor filme brindou o filme ‘CODA’,
certamente um dos filmes mais consistentes de um ano particularmente débil no
âmbito do cinema e onde tenho poucas dúvidas em apontar ‘Dune: Part One’ como o melhor do ano de forma destacada, os seus seis Óscares suportam bem a minha tese.
O
Post já vai bastante longo mas não posso evitar um cometário ao acontecimento
mais marcante da cerimónia (o estalo mais visto de sempre). A atitude de Will Smith apenas demonstrou a sua
falta de poder de encaixe e uma amostra da sua instabilidade emocional, ainda
por cima um actor que saiu do anonimato precisamente através da comédia, os
meus parabéns à incrível capacidade de improviso de Chris Rock que lhe permitiu prosseguir com o espectáculo.